sábado, dezembro 01, 2007

O acaso, Deus, a existência e outras balelas...

O acaso é a condição inadequada da vida,
Imaginemos [por acaso] se fossemos outras pessoas,
Outros seres, em outras dimensões ou outros corpos e opiniões.

Tudo seria diferente!

Mas pelo sim ou pelo não,
Continuamos existindo,
Assim dessa mesma maneira.
Até quando Deus queira...

... Deus e o acaso,
Relação incompreensível!
Um sustenta a existência,
Outro a abdica de coerência.

E nós,
Com nossas vidinhas.
Participamos dessa disputa.
Se algo nos diz ou não,
Isso depende da nossa compreensão.

Em minha humilde opinião,
Penso que é necessário,
Analisarmos cada fato,
Desde a potência ao seu ato.

E assim morre o acaso.

Por isso, não foi por acaso,
Que escrevi essas linhas,
Ainda não defini bem a sua razão.
Mas isso fica para outra ocasião.

Caso encerrado!

quinta-feira, outubro 11, 2007

Rebelde sem Causa

Mentem aqueles que dizem,
Que a realidade é transformadora.
Não há nada mais conservador que o real.

A realidade, por ela mesma, nos reprime,
Nos dispersa e nos consome...
Forçando-nos a cada dia à sua lógica.
A lógica da causalidade.

Por isso não há como enfrentar a realidade,
Sem um bocado de sonhos.
São os sonhos que a transformam.

É preciso evitar que os sonhos,
Se tornem realidade...
Mas não a nada melhor,
Que fazer da realidade um sonho!

Sendo assim um rebelde sem causa,
Mas com vontade imensa de sonhar.

quinta-feira, agosto 02, 2007

Luna Bella (o Coyolxauhqui)

Hoy es una noche de luna llena,
Noche en que la luna resalta,
De la oscuridad del cielo,
Y se pone iluminada en la bóveda celeste.

Y nosotros aquí en la Tierra,
La miramos,
Sin saber lo que realmente pasa más arriba.

La verdad,
Para que la luna se ponga,
Así tan hermosa, clara,
Y trascendente.
Es necesario que antes,
Ella pase por todo un proceso…
Un proceso de mentiras y engaños.

Lo que creemos que sea la luna,
En realidad es tu más falso retrato.
La verdadera luna,
Se esconde en la luna nueva.

Me contestarán los más eufóricos:
¿Pero en la luna nueva no se ve nada?
¡Por supuesto!
Me los diré.

La verdad de la luna,
Se encuentra en la luna nueva…
¿Nunca se han preguntado lo porque,
El lado oscuro de la luna nunca se ha clareado?

La verdad no se encuentra fácilmente.
Para que se pueda verla,
Es necesaria la luz mentirosa del sol.

Y una vez más me contestarán:
¿Pero la luz del sol no es sinónimo de verdad?
Y nuevamente les diré:
¡Por supuesto!

Entretanto la luz verdadera del sol,
Cuando llega la noche,
Transformase en una luz mentirosa,
Pues todo lo que es de día,
Pasa a no ser en la noche.

Así que pasa la fase de la luna nueva,
Empezamos una jornada de mentiras.
Que se agiganta con el pasar de las noches.

La primera mentira,
Es la más delgada,
La luna creciente.
Porque las grandes mentiras,
Comienzan pequeñitas.

Los primeros rayos del sol,
Entrando en contacto con la esfera lunar.
Se la arrancan sus verdades,
De una forma obscena.
Que ella se queda sin fuerzas,
Para alguna reacción.

Y poco a poco,
Noche por noche,
Ella obedece el orden,
De mostrarse totalmente a todos.

Hasta que llega la luna llena.
¡Esa noche tan fatal!
Cuando las fuerzas de la luna,
Son tan pocas que ella tornase,
Un sol para la noche.

Nos encantamos cuando le pasa eso.
Pero ahora sabemos,
Que lo que vemos bello,
En la verdad,
Es una forma de violación.

Después de esa semana criminosa,
Las cosas para luna se revierten.
Los rayos del sol,
Cansados de explotarla,
Buscan otras lunas más virginales,
En otros lugares del espacio.

Y por la tercera y última vez,
Me contestaran:
¿Pero adonde está la belleza de la luna?
Está en la próxima fase.

La luna menguante.
Cuando se menguan las mentiras
Y se va restableciendo la verdad.
Mismo que no sea completa.
La completa verdad,
Está en la luna nueva.
Y regresé al principio.

En la luna nueva,
Ella puede ser lo que es.
Mezclándose a la oscuridad de la noche.

Su belleza, como diría Heidegger:
- Está en no mostrarse.
Está en conquistar el derecho a la oscuridad,
En mantenerse con su realidad, con su verdad.

La hermosura de la luna,
Está en lo que no nos es dado ver.
Sino por una violencia.

Porque la belleza de la luna,
Es algo im-previsible.

Dedicado e inspirado por Zahmeri, Dakini, Leonor, Eon Blue y todas sus otras fases.

terça-feira, julho 17, 2007

Minha Visão

Lembro-me bem,
Estava em uma sala escura,
Vendo um filme que passava,
Em mais uma aula de geografia.

Foi quando tentei, por distração,
Fechar o olho esquerdo,
E ver tudo com o direito.

Percebi, assim, que havia algum problema,
Em minha visão.

A partir desse dia descobri,
Que jamais voltaria a enxergar,
Da mesma maneira.

E mesmo com os óculos,
Minha vista direita ainda segue turva.

Por isso optei em ver tudo,
Com e pela a esquerda!

terça-feira, junho 12, 2007

Breve Histórico do Medo

Nestas minhas futuras palavras,
Quererei, assim espero,
Tratar ou retratar,
Do histórico do medo.

Analisarei o passado,
Um passado tão passado,
Que passa pelo pretérito,
Perpassando nosso arquétipo,
Deixando o tipo para traz,
E chegando ao arqué.

Quando o homem ainda não se percebia,
Enquanto homem de fato.
Por ser tão emancipado,
Não tinha vinculo algum.
E por isso sentia medo de tudo.

Cada rio de sol,
Queimando a pele do rosto,
Era aterrorizante.

Como saber se esse raio de sol,
Não era um bocado de fogo,
Que se alastraria por todo seu corpo?
Ou então, se apagaria num instante,
Impondo a ele o frio de uma noite eterna?

Prontamente, este descentrado homem,
Ungira o sol como seu rei supremo,
Seu primeiro deus.
Que retorna em cada amanhecer.


Neste momento o homem intimida-se pelo sol,
Ou seja, se tornando intimo dele,
Ao invés de temê-lo.

Assim aconteceu a primeira revelação de Deus!

Com a descoberta de um deus,
O homem encontra um caminho,
Uma fuga de todos os seus males.
Cada medo, um a um,
Foi oferecido nas mãos de Deus.

Todos os seus receios,
Foram divinizados.
Para que o medo não o dominasse.

O último medo foi vencido,
Quando Deus veio até nós,
Para salvar-nos do medo da morte.
Dando-nos a vida eterna!

Até que um dia, muito tempo depois,
Esse mesmo homem cansado de Deus,
Resolve libertar-se.
De tanta dominação.

Esquecera seus medos passados,
E racionalmente fez sua nova libertação.
Homem e Deus agora,
Já não se ligavam mais.

A razão surgia como a Nova Deusa,
Pronta para todos os desafios,
Ávida por conhecimento e trabalho!
E não temia o medo.

Juntamente com a razão,
Veio o relógio,
Demarcando o tempo racional.
Cada segundo é marcado,
Em seu círculo viciado.

Delimitando o tempo,
Controlamos o passado,
Acabamos com o presente,
E organizamos o futuro.

Porém este rebelde,
Não se deixa domar.
Cada passo que damos,
É uma experiência inesperada.
Qualquer previsão futura,
É desbancada pelo próximo milésimo de segundo.

Ressurgindo assim nosso antigo amedrontamento.
O que será de nós no futuro?
Será que o sol se apagará?
Ou nos consumirá completamente?

Existindo apenas um,
E absoluto medo:
O medo do futuro.

Na realidade,
Não existe medo de barata,
E sim o medo de que ela voará,
Para cima de você.

Não existe o medo do escuro,
Mas o medo do que acontecerá,
Enquanto você estiver nele.


Não existe o medo da morte,
Mas o medo do futuro infinito,
Que espera por todos nós.

Por isso, Deus não é o medo,
Mas o futuro. E sua solução.
Muito mais que o próprio medo,
Tememos o futuro.

Por isso, atemorizados leitores,
Não temam o fim dessas palavras,
Pois elas não têm futuro!

terça-feira, abril 24, 2007

ERAS DA CRIAÇÃO

No princípio era o nada e o nada era pura escuridão.

Da escuridão surgiram, ao mesmo tempo, dois camaleões, um vindo da esquerda e outro da direita. Até pararem no centro da escuridão.

Os dois ficaram ali parados por algumas eras, até que um dia o camaleão da direita começou a movimentar e lentamente suas pastas e sincronicamente, foi ganhando um tom avermelhado em sua pele. Em contra-resposta o camaleão da esquerda tentando imitá-lo ganhou um tom alaranjado.

Se sentindo ameaçado o camaleão avermelhado lançou sua intrépida língua na direção do outro para que ela o pegasse e, assim, o levasse para a sua boca.

A cada feroz mastigada do camaleão avermelhado, o camaleão da esquerda mudava de cor, na primeira do tom alaranjado, passou para o amarelo, na segunda o tom amarelado passou para o verde, na terceira do tom esverdeado passou para o azul, na quarta passou do tom azulado para o anil, na quinta do tom anilado para o violeta...

Foi quando o camaleão o engoliu por inteiro!

Se sentindo vitorioso o camaleão começou a andar para a outra ponta do nada. Quando se supetão o camaleão engolido se pinta de luz, explodindo assim o camaleão que se achava vitorioso.

E essa explosão deu origem a uma carga imensa de energia, que posteriormente criou as estrelas, planetas, luas e asteróides.

E Deus viu que isso era bom!

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

REFLEXÃO VERDADEIRA

A verdade dói,
Perfurando como uma espada,
O coração daquele que está à beira de um precipício.
Empurrando-o até o fundo daquela fenda.

Cada verdade,
Recebida na vida,
É um duro golpe por traz,
Que nos faz refletir.
E recomeçar nossa subida,
Até abertura da fenda da vida.

Destrói dolorosamente os erros cometidos,
Mas pressiona para o recomeço.
O recomeço é o berço das possibilidades,
E a soma das possibilidades chama-se: Liberdade!
A liberdade nada mais é do que a própria vida.

Já a mentira,
Retira fantasticamente,
A dor própria da vida.
Transporta para um mundo lúdico e irreal.

Elevando até o topo do precipício.
Numa over-dose delirante!
A mentira nos mata sem sentir.
Anestesiando a realidade.

Roubando a liberdade que nos é de direito,
Tornando-se assim a morte em vida.
Pois se continua no erro.
E não há recomeço.

É melhor viver na dor da verdade,
E recomeçar sempre,
Que morrer ludicamente em mentiras!

terça-feira, janeiro 23, 2007

Dentro de um ônibus


Os raios de sol ainda não tinham rompido o domínio da noite, mas eu há algum tempo já tinha levantado da minha cama a caminho do trabalho, num burocrático departamento do governo do Estado do outro lado da cidade, como auxiliar de escritório.

Como sempre faço, ao reconhecer o meu coletivo, levantei o braço direito, sinalizando que eu iria pegá-lo. – como se fosse preciso, pois sempre pego o mesmo ônibus, e é sempre o mesmo motorista. Creio que ele pararia para mim mesmo que eu não fizesse sinal algum. Vivemos numa sociedade cheia de formalidades e o sinal para parar o ônibus é uma delas.

O ponto de ônibus da minha casa é próximo do ponto de partida da linha desse ônibus, o que me dá a possibilidade de escolher o lugar para me sentar, já que ainda não há muitos passageiros dentro dele. Porém à medida que o ônibus faz o seu percurso, o espaço vazio do veículo, vai se tornando cada vez mais escasso. Vinte minutos depois de me assentar, já não há mais lugar sentado. E quinze minutos depois disto, já não há nem mais lugar em pé. Entretanto, o motorista não parece se compadecer com essas pessoas que estão espremidas ali, ele sempre tenta colocar mais alguém. Talvez no fim de sua jornada de trabalho esse motorista aposte com seus colegas quem conseguiu pôr mais passageiros em seus carros.

O sol começa a despontar no céu e os passageiros do ônibus tentam se acomodar, como se estivessem querendo desobedecer a Lei Natural da Física, de que dois corpos não ocupam o mesmo lugar no mesmo espaço. Todas as medidas possíveis para dar espaço dentro do ônibus já foram tomadas como: dar o acento as pessoas mais gordas, segurar as mochilas e as bolsas para que não atrapalhem a penosa travessia dos passageiros no que sobrou do corredor do ônibus.

Essas medidas podem amenizar um pouco a situação daqueles que estão apertados naquele momento, mas como já foi mencionado, o motorista faz daquele meio de transporte um coração de mãe, sempre cabendo mais um... Mas tenho quase certeza de que o coração dele ou de seu patrão não é de mãe e sim de pedra.

Os passageiros desse ônibus começam o seu dia de trabalho, enfurnados dentro de uma lata de ferro que nem ar-condicionado tem. Lutam para entrar e lutam para sair do ônibus. As mulheres mais jovens e com um pouco mais de carne em seus corpos, ainda tem outro objetivo, que nem quase nunca é alcançado: o de sair do ônibus sem que nenhuma mão boba ou qualquer outra parte boba bolinem seus corpos. Uma tarefa árdua devido à grande proximidade entre as pessoas, facilitando muito a atuação dos tarados matinais.

Quase duas horas depois de eu fazer sinal para este aglutinador forçado de gente que chamam de ônibus, o meu ponto do meu trabalho se aproxima. Muita gente ainda continua dentro do ônibus. Para facilitar minha decida, vou me levantando um ponto antes do meu. Assim posso pedir licença a todos que estão em meu caminho, e são tantos os que estão nele... que licença deve ser a palavra mais pronunciada por mim.

Alguns para não repeti-la como eu faço, preferem utilizar um som sinônimo parecido com o tsts, mas eu acho isso muito impessoal. Acho que essas pessoas merecem um pouco mais de pessoalidade e dignidade em sua vida.

E é nisso que venho pensando há algum tempo, em melhorar de alguma forma a viagem que elas fazem para ir ao trabalho. Sei que muitos dos passageiros desses ônibus ainda tomam outros meios de transportes com outros ônibus e trens e que com certeza são tão cheios ou mais quanto este.

Enquanto subia no elevador para chegar até o andar onde eu trabalhava, analisei todas as características que pertenciam aquele ônibus, e nas minhas formas de atuação para melhorar aquela viagem.

Pensei em algo que pudesse alegrar um pouco aquelas pessoas. Se eu tivesse uma boa voz, eu poderia cantar para elas, mas logo me dei conta que só sirvo para cantar no banheiro e baixinho, para que os vizinhos não me escutem e reclamem das minhas cantorias.

Descartando a possibilidade de cantar, lembrei que quando jovem gostava muito de fazer poesias e ao menos os meus amigos gostavam delas. Algumas meninas até choravam tamanha a emoção que eu causava. Decidi, por fim, que retomaria a minha veia poética para dar um pouco de luz e erudição aquela gente que estava cheia de contatos físicos, mas com pouca leveza espiritual devido às irritações diárias.

Chegando à minha mesa comecei a rascunhar os primeiros versos da poesia que entreteria aqueles passageiros tão vazios de esperança! Mas que também serviriam para posicioná-los com uma nova postura diante das injustiças a qual eles são tratados todos os dias. Por isso mais que uma forma de diversão a minha poesia deveria dar consciência a esses indivíduos. Foi com esse espírito que me veio à lembrança o velho Marx, e inspirado em suas palavras comecei a rascunhar numa folha que seria toda branca, não fosse o timbre do governo:

Proletários deste coletivo!

Proletários não, muitos desses trabalhadores tem pouca instrução e não saberiam o que isso significa. Sendo assim recomecei:

Trabalhadores deste coletivo!
Prestem bem a atenção!

O que poderia rimar com coletivo? Era preciso que a poesia rimasse, porque a rimas chamam a atenção do público.

Trabalhadores deste coletivo!
Prestem bastante atenção!
Sei que posso ser agressivo,
Pois isso é minha munição!

Roubam-lhes a vida,
E eu venho lhes roubar de novo,
Já estou um tanto desgostoso,
E por isso quero essa briga!

Todos levantem as mãos!
Pois aqui estamos juntos,
Mas não estamos unidos,
É preciso um empurrão!
Para não sermos aflitos!

Unidos podemos tudo!
Unidos formamos um povo,
Não se pode ficar mudo,
Façamos tudo de novo!

Minha inspiração chegou ao fim. Amanhã completarei o meu plano dando inicio as minhas declamações diárias. Com isso, presumo que, diminuirei os transtornos causados pelo enlatamento dos passageiros e de sobra ainda farei com que eles tenham consciência do sistema que os aperta tanto.

Depois de passar o meu dia de trabalho carimbando e lendo papéis, me encaminho para um restaurante para jantar, tomar duas tulipas de chope e no final um cafezinho para limpar. Faço isso não porque não goste de cozinhar, mas para fugir do horário de pico de volta para casa. Pois agüentar aquele sofrimento duas vezes seria demais para mim. Minha sorte é receber vale refeição!

Volto para casa em um ônibus relativamente vazio, onde posso relaxar e tirar uma pequena soneca. Mas não hoje! Hoje farei o trajeto lendo os meus versos até tê-los em minha mente de cor e salteado. Decorar os meus versos é um gesto assaz importante, pois retirar um papel do meu bolso naquele aperto seria muito complicado para mim. Além de incomodar outras pessoas que estarão do meu lado e elas próximas as outras, podendo desencadear uma corrente de incomodo por todo local.

Entro em minha casa e logo tomo meu banho, já me preparando para dormir. Deito na cama ainda com os meus versos e mãos. Dou uma última lida e em seguida fecho meus olhos e declamo meu poema em voz alta sem errar as ordens dos versos. Estou pronto! Ponho o papel na mesa de cabeceira, programo o despertador e apago a luz, para finalmente dormir.

Levanto-me ao som do despertador. Prontamente me arrumo para ir trabalhar. Hoje, distintamente dos outros dias tenho uma vontade enorme de pegar aquele ônibus. Mas minha ansiedade deve ser controlada, pois minha pressa pode fazer com que eu me arrume demasiadamente rápido e pegue o ônibus anterior ao que pego rotineiramente.

Vou até o ponto espero o coletivo passar e faço o mesmo sinal de sempre, mas hoje o faço muito mais empolgado do que nos outros dias. O motorista pára e eu entro. Ainda existem muitos lugares disponíveis, mas não me sentarei em nenhum, prefiro declamar de pé.

Como sempre o ônibus se abarrota de gente. A temperatura começa a esquentar e a dificuldade de se respirar aumenta a cada passageiro novo que adentra ao recinto. Esperarei mais cinco minutos até que fique insuportável aqui dentro para poder começar. Afinal quanto pior melhor, ou quanto mais público mais minha mensagem se espalhará.

Sinto que é o momento tão esperado por mim chegou. Relembro os versos antes de proclamá-los à minha platéia. Tomo um pouco de ar, o pouco de ar que é possível tomar e começo com meu ato:

- Trabalhadores deste coletivo!
Prestem bem a atenção!

Vejo que as pessoas do fundo do ônibus começam a se movimentar para escutar o que eu digo. Continuo...

- Sei que posso ser agressivo,
Pois isso é minha munição!

Roubam-lhes a vida,
E eu venho lhes roubar de novo,
Já estou um tanto desgostoso,
E por isso quero essa briga!

Todos levantem as mãos...

Em um gesto repentino algumas senhoras que estavam ao meu redor realmente levantaram as mãos. Percebo que os passageiros no final do ônibus começam a se exaltar. E ao mesmo tempo em que isso acontece o motorista pára bruscamente! Sai da direção e me agarra apertando os meus ombros. Outros homens o ajudam e me pegam pela perna. E eu sem muito poder de reação me vejo sendo lançado para o lado de fora do ônibus, caindo com minhas costas no chão, sem que eu pudesse terminar de declamar os meus versos.

Antes do motorista arrancar com seu ônibus, ainda gritou comigo dizendo que só não me levaria para a delegacia porque seu serviço estava atrasado. Os outros homens que o ajudaram voltaram depressa para o ônibus, para retornar aos seus lugares.

Só fui compreender a ação do motorista e dos passageiros no dia seguinte, quando um jornal sensacionalista publicou em primeira pagina: PASSAGEIROS IMPEDEM ATENTADO TERRORISTA EM ÔNIBUS.

Foi só assim que eu percebi que além de analisar os fatos, planejar a ação e praticá-la, também é preciso saber qual a disponibilidade de mudança que o povo está disposto.

Depois disso passei a levantar da cama mais cedo, para pegar o primeiro ônibus da linha. E assim tive que me acostumar novamente a fazer sinal a um novo motorista...